Estratégia jurídica
em casos complexos

CASOS COMPLEXOS

Estratégia jurídica em casos complexos

Casos que envolvem diferentes agentes públicos exigem coordenação e relacionamento.

U m contexto jurídico que envolva diferentes agentes públicos, reguladores e fiscalizadores – os chamados casos complexos – exige das empresas experiência, criatividade, rapidez na tomada de decisões e uma alta capacidade de lidar com diversos interlocutores, além do conhecimento jurídico multidisciplinar.

As várias jurisdições envolvidas em um mesmo processo ou investigação acabam por repetir, recorrentemente, processos e atravancar o andamento dos casos. Isso ocorre porque é comum surgir uma zona de intersecção de competências entre os diversos órgãos públicos envolvidos em um único caso, gerando maior complexidade com autuações e regulamentações complementares ou contraditórias.

UMA NOVA VISÃO HOLÍSTICA

Um caso complexo, que envolve múltiplos órgãos públicos, exige a atuação de várias frentes do Direito.

E ssa visão precisa dar uma abordagem ampla para evitar a recorrente falta de coordenação nos processos e traçar um mapeamento estratégico de atuação.

A partir de casos de grande repercussão que ocorreram no País nos últimos anos, com origem desde a área criminal até a ambiental, a abordagem holística para resolução dos problemas já vem acontecendo e marcando uma mudança de atitude das empresas. O resultado percebido é a adoção do trabalho preventivo para, se e quando ocorrerem as situações de crise, a equipe envolvida estar preparada para agir.

Conforme explica o sócio Flávio Pereira Lima, “de 10 anos para cá, vemos a preocupação das empresas com o preventivo, passando a analisar as situações pela ótica de diversas áreas e na busca por resolver os problemas por meio de acordos e mediação”.

Da parte dos órgãos públicos, ainda que haja falta de coordenação, percebe-se a vontade de resolver conflitos da melhor forma, evitando, em alguns casos, a judicialização. E o Ministério Público (MP) tem papel importante nesse processo. Segundo o sócio Thiago Luís Sombra, “o MP pode ser o ponto focal das conversas”.

É desejável, ainda, que haja uma mudança de cultura jurídica para que os envolvidos passem a sentir os efeitos diretos da segurança oferecida pelos tribunais ao interpretarem e aplicarem as leis. Em 2013, com a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), que prevê a punição civil e administrativa das empresas por delitos cometidos, os órgãos do Legislativo e do Executivo começaram a implementar regras para fomentar programas de compliance.

 

Leitura complementar

“Os principais aspectos de um Programa de Compliance Anticorrupção e o novo Manual de Implementação da Controladoria-Geral da União (CGU)”


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As fases e necessidades
de um caso complexo

O maior risco é a empresa não dimensionar adequadamente todos os efeitos que uma punição pode causar. Segundo Thiago, “o ponto de partida é entender o tamanho do caso e definir uma ação coordenada a fim de não haver um desalinhamento de informações. Depois, ter um time alinhado que estabeleça uma linguagem comum e, por fim, ter mais clareza sobre quais as funções que cada uma das jurisdições pode aplicar e o impacto de cada uma”.

Para a sócia Ana Cândida Sammarco, uma atuação multidisciplinar jurídica é importante para alinhar as diversas regulamentações e dar a segurança jurídica aos envolvidos.


“A melhor prática é colocar na mesma mesa todos os órgãos envolvidos para que eles sintam a problemática e conheçam os problemas causados para chegar a uma resolução”.

Nesse sentido, fazer o mapeamento dos diversos stakeholders envolvidos e manter a interlocução prévia com todos é essencial.

A partir da instalação de uma crise, outra fase tem início, mais focada na execução. “A primeira coisa, sempre, é avaliar o risco à saúde e à vida humana”, aponta a sócia Lina Pimentel. Em seguida, vêm o diagnóstico do caso, o mapeamento de quais órgãos estão envolvidos e do que a empresa já fez efetivamente para, finalmente, tentar colocar todos os agentes na mesma conversa.

PROTAGONISMO E COMPLIANCE

A falta de organização do processo jurídico, muitas vezes, cria mal-entendidos, redundâncias decisórias e contradições jurídicas que causam procrastinação da decisão final.

Sem um órgão coordenador que dê as diretrizes, o caso se torna mais complexo, exigindo que os agentes privados assumam o comando da organização do processo.

“A empresa é a principal prejudicada. Se ela não liderar as conversas com os órgãos de controle, vai ser carregada para dentro de uma investigação na pior das posições”, alerta Thiago. Em uma crise empresarial, a companhia precisa ser a protagonista e narrar os fatos aos diversos interlocutores para não ter que responder à narrativa negativa de terceiros. Sendo assim, a liderança das interlocuções passa pela mensagem que se quer transmitir.


Somado ao protagonismo, um projeto consistente de compliance também traz segurança em um processo de crise. Segundo o sócio Kevin Altit, “o compliance funciona como uma vacina para momentos de crise”.

Porém, não basta adotar códigos de conduta e políticas anticorrupção. O fundamental é fazer a empresa assimilar isso como um traço da sua cultura. “A forma de formalizar essa cultura é por meio de um conjunto de políticas e regramentos que formalizam o que a empresa acredita ser o certo. Isso começa muito mais pela cultura e pela conscientização; o código de conduta é só o instrumento”, reforça Kevin.

 
 
 

Criatividade para encontrar alternativas


A greve dos caminhoneiros, ocorrida em maio de 2018, ilustra como lidar com um caso complexo. Uma série de agentes públicos e privados se mobilizou, juntos, a fim de tentar fazer escoar a produção das empresas, que estava interrompida pelos bloqueios.

“Foi um trabalho de “guerrilha”, de mapear todo o cenário e identificar localmente quem poderia atuar também – de advogados parceiros até membros do Judiciário em cada cidade e região. Foi preciso atuar de forma coordenada com os diversos órgãos que tinham o mesmo interesse jurídico”, relembra o sócio Flávio Pereira Lima.

Tínhamos a liminar, o apoio e o respaldo jurídico, mas o clamor popular estava apoiando os caminhoneiros e fechando as ruas. Tivemos que ter criatividade para solucionar problemas que, até então, eram novos.

Esse é um típico caso em que os vários atores envolvidos tendem a chamar o protagonismo para si. Nessa situação, um caso complexo permite imaginar novas possibilidades de resoluções para o futuro. E o contato com stakeholders é imprescindível: ações proativas – seja buscar os órgãos, ou seja, a comunicação da empresa – refletem uma melhor estratégia do que ser reativo.